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[15/10/06] Kafundoh Noir

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Psycho Martini
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Mensagem por Bad Crow Dom Ago 30, 2015 2:41 am

O período mais sombrio do ano se impunha sobre Kafundoh como uma mordaça cobrindo a boca de uma mocinha de filme antigo. Se normalmente o Outono já era melancólico e nefasto, com sua visibilidade péssima, nevoeiros dignos da Londres de Sherlock Holmes, pessoas em capas de chuva andando rapidamente e as água escorrendo pelas ladeiras como se as ruas tivessem se tornado riachos, este ano particularmente mostrava-se insuportável: além das trovoadas e boatos sobre fantasmas, vampiros e lobisomens que sempre se tornavam populares nessa época, dessa vez haviam monstros de verdade andando pelas ruas da cidade.

Quase ninguém se atrevia a dormir sozinho nesse período do ano, devido aos constantes barulhos inexplicáveis que gelavam o sangue e os pesadelos que pareciam acometer com frequência o sono dos habitantes da cidade.

O calor humano oferece um certo sentimento de segurança, e os moradores de Kafundoh não hesitam em fazer uso de tal recurso. Uma prática bastante comum entre os jovens da cidade nos meses de agosto, setembro e outubro - aqueles que formavam o Outono - é organizar festas do pijama e dormir em grupos largos. Ter tantas pessoas reunidas no mesmo quarto, muitas vezes dividindo camas, costuma fazer com que os trovões e inexplicáveis sons noturnos pareçam menos assustadores.

Nossa história de suspense precisa que alguns elementos sejam previamente estabelecidos. Primeiramente, deve-se avisar que as cenas a seguir são coloridas em preto-e-branco, ao melhor estilo Sin City. Apenas os olhos e cabelos dos personagens são coloridos de forma diferente, causando um contraste estilizado para quem assiste a cena.

Em segundo lugar, as cenas serão narradas pelos próprios personagens. Desta vez teremos total acesso a seus monólogos internos.

Terceiro... não se importe com os barulhos súbitos. São apenas os trovões.

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=

O primeiro post será composto dos personagens retornando à cidade (no caso dos que já estão lá, seus treinos terão sido completados no dia anterior, e agora eles estão fazendo o que o jogador desejar).

Os posts dessa rodada deverão ser completamente narrados em PRIMEIRA PESSOA.

Usem essa oportunidade para explorar bem os sentimentos dos seus personagens em relação aos seguintes assuntos:

1) o que ele pensa de si mesmo
2) o que ele pensa sobre os outros manos (e outros personagens, se o jogador desejar)
3) o que ele está sentindo agora que voltou pra Kafundoh

Esse post é mais profundo do que aqueles que normalmente fazemos, mas por isso mesmo é uma oportunidade de vocês se conectarem com seus personagens e explicarem seus sentimentos num nível que a narrativa comum nem sempre permite.

(Ah, e cabe o lembrete: oficialmente, "O Funeral" não é mais o último tópico do RPG. Página virada com sucesso.)
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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por Psycho Martini Dom Ago 30, 2015 11:50 pm

OFF: As cores utilizadas no texto NÃO são para diferenciar os personagens.
Elas ilustram a única cor presente no personagem.
Por exemplo, caso de Hiroshi é o cabelo e, no caso dos gêmeos, cabelos e olhos.
Como eles possuem cores iguais as falas vão ficar com cores iguais, me dêem licença poética.

ON:

[Kaede]

Nunca gostei do outono. Eu detesto chuva, umidade, neblina, dias escuros e essas coisas que fazem a gente ter que ficar dentro de casa.
Naquela época a gente ficava muito dentro de casa.
Se bem que... eu não deveria mais deixar essas memórias mexerem comigo, afinal...

-Kaede...? Você está bem, filho? O que... está fazendo aí, deitado embaixo da chuva? – a voz de Hiroshi parecia bastante preocupada.

Quando me virei para encarar o velho, gotas de chuva escorreram para meus olhos. A visão dos cabelos azuis de Hiroshi ficou borrada.

- Estou meditando. – respondi, sentindo que o tom não saiu tão casual quanto eu desejava.

-Não está tentando pegar uma gripe para faltar os treinos, está? – Já o tom dele era de brincadeira, mas ainda havia preocupação na sua voz.

Coisa esquisita.
A cada dia, ele se parece mais e mais... com o pai Hideki. Até no jeito de falar, agora.
Justo ele que viera com aquele papo que eu e o Kaoru tínhamos que buscar nossa própria identidade e que “romper a placenta” era bom.

-Tá gagá, velho? Andou lambendo suvaco?
Como se eu, Kaede Ryuuji, faltasse treinos! No dia que porcos voassem, talvez.
-Isso aqui é quase o mesmo que ficar embaixo de uma cachoeira.- inventei.

A realidade é que eu estava ali me deprimindo voluntariamente. Literalmente curtido uma fossa na grama do jardim.
A cidade cada vez mais vazia e a convivência diária com o meu pai despertavam emoções não muito boas: angústia, apreensão, receio, insegurança... O outono também não estava ajudando em nada.
Era bem verdade que meu pai Hiroshi mudara de uma forma bem radical; os treinos podiam ser pesados, mas nunca eram massacrantes e quase nunca o ouvia gritar – quando o fazia, era de jeito motivacional, mas... não era como se todas aquelas memórias, aqueles sentimentos ruins fossem sumir em apenas meses!

E... talvez, TALVEZ, eu esteja com um pouco de saudade da Kiara. UM POUCO, só porque ela ficou na minha cabeça antes de ir embora...
Ah, é, Hitori faz falta também, aquele pirralho.

De qualquer forma, era tudo muito estressante, sentimentos demais para a minha cabeça.

-Kaoruuu, seu irmão está fazendo coisas sem sentido de novo! – ouviu Hiroshi choramingar, como ultimamente ele fazia quando não sabia o que fazer com um de nós.

Pisquei, enxugando a chuva dos meus olhos e Kaoru entrou em foco. Os olhos e cabelos azuis como safiras em um rosto muito parecido com o meu. Não parecia surpreso.
-Estou vendo. Deixe-o morrer de pneumonia. Quem sabe assim ele para com todo esse drama. – ele revirou os olhos, sentando-se na pequena varanda. – Ele está sofrendo de amor, pai Hiroshi.

De novo com essas piadinhas, Hiroshi vai levar a sério um dia desses!
Levantei rapidamente, estalando os dentes.
- Não sou você!- resmunguei. E senti a necessidade de alfinetar mais: -Não sou do tipo que fica anos sofrendo dor de cotovelo...

Foi efetivo: Kaoru deu um sorriso torto. Haha, estava mordido.
-Apesar de você não merecer, vou fazer seu dia melhor: Kiara e seus amiguinhos da pousada voltaram. Ouvi a notícia há pouco.

Ela voltou? Então não foi embora de verdade?
Ela vai correr todo esse risco e ficar aqui até novembro? Ela não tem mesmo nenhum juízo!
Aquela pirralha ia aprender, quando a visse novamente...
Sentiu uma sensação engraçada na barriga.
Iria vê-la novamente.... e logo.

-Quem se importa que aquela pirralha veio se matar com a gente? – e tive o cuidado de revirar os olhos.

-Vocês não vão morrer! – protestou nosso pai, batendo o pé no chão.

-Mais gente, menos risco de morrer?
Kaoru bem que tentou, mas não conseguiu esconder que ele sabia que eu não estava sendo sincero.
Sempre foi assim; mentir um para o outro sempre era uma atitude de risco: as vezes colava, mas muitas vezes era um tiro na água.

-Só vai atrapalhar e dar mais morte pra lamentar.- dessa vez eu estava sendo sincero.
Melhor seria que ela não estivesse na guerra e eu não tivesse mais uma coisa pra me preocupar.

-Não seja tão duro com a moçoila, ouvi dizer que todos eles treinaram duro. – Meu irmão se aproximou e me puxou para a varanda, me tirando da chuva.

-Nós também e nem por isso me sinto seguro. – desabafei. Ficar perto do Kaoru num dia de chuva tinha esse efeito.

-Eu sei.
Ele encostou a testa dele na minha e tudo o que eu pude ver foram aqueles dois olhos azuis.
-Eu também me sinto assim... mas vai dar tudo certo, enquanto cuidarmos um do outro, não é mesmo? O medo só machuca quem está sozinho.

Não pude deixar de sorrir. Aquela frase me trazia memórias...


[Kaoru]

Apesar do clima, eu estava feliz por não estar em Orient e sim em Kafundoh. Temi que fossemos treinar na nossa terra natal, mas pai Hiroshi não quiz ficar de fora da Guerra, e assim voltaramos todos para Kafundoh. Menos Hitori.
Sinto falta do meu “irmão mais novo”.

Chegando na soleira da nossa casa, ergui a cabeça para encarar a construção; parecia ter sido arrancada de dentro do condomínio dos Ryuuji e colocada ali, de tão parecida com aquelas casas que era – completamente oriental e com brasões dos Ryuuji por toda parte. Nem havia percebido esse fato antes de voltar para Orient e reavivar as memórias.
Afinal, eram as memórias de DENTRO de casa que eram mais fortes.

Sacodi o guarda-chuva e tirei minha capa assim que adentrei na varanda que circundava a casa. Como esperado, meus pés estavam encharcados até a alma.
Sair era tão trabalhoso no outono. Mas era isso ou ficar trancado. Ficar trancado não era opção, ou acabaria deprimido.

Não que as coisas estivessem ruins; não estavam!
Elise estava de volta na sua vida... apesar de não poder vê-la sempre que queria.
A maioria da sua família havia ficado... apesar de dar uma pena deixar Hitori longe.
Estavam treinando diariamente e de modo intensivo, ficando mais forte a cada dia... apesar de que aquilo poderia não ser suficiente, tendo em vista os inimigos.
Hiroshi havia mudado e estava sendo um bom pai e um treinador com ótima didática... apesar dos erros do passado dele estarem interferindo na nossa relação de um jeito inevitável.

Suspirou.

Estou me esforçando para fazer algum tipo de vínculo com meu pai e sei que o velho se esforça muito mais que eu, mas...
Era como uma camisa com mais botões do que casas. Nunca ficava muito bem, de um modo ou de outro, ficava esquisita.
Sei que tudo isso está sendo bem mais difícil pro meu irmão...
Uma sorte ter tanta coisa para treinar: as lutas e estratégias enchiam os assuntos e preenchiam os silêncios desconfortáveis e, muitas vezes estavamos cansados demais para interagir ou nos importar.

Por falar no Kaede... tenho certeza que ouvi sua voz vindo do jardim por trás da casa.

-... é quase o mesmo que ficar embaixo de uma cachoeira.

Assim que virei a esquina, dei de cara com meu irmão estirado na grama do jardim, braços e pernas abertas, embaixo da forte chuva, parecendo algum tipo de boneco muito grande abandonado por uma criança ingrata. Pisquei.
Segundos depois de me recuperar da visão, notei Hiroshi ali na varanda, encarando a mesma cena com uma expressão perdida e confusa. Estava claro que ele não havia ideia de como lidar com aquilo.

Quando nosso pai me percebeu, a expressão mudou para alívio. Acho que ele estava certo de que eu saberia o que fazer.
-Kaoruuu, seu irmão está fazendo coisas sem sentido de novo! - aquela voz que ele fazia era cômica.

Aquilo era óbvio. Estamos falando do Kaede.

-Estou vendo. Deixe-o morrer de pneumonia. Quem sabe assim ele para com todo esse drama. – revirei os olhos, mais por costume, enquanto me sentava. Kaede sendo Kaede de novo. A técnica mais efetiva seria ferir o ego.
Ele está sofrendo de amor, pai Hiroshi.

Bingo. Logo vi meu irmão se levantar.
- Não sou você!- ele estava fazendo aquele tom emburrado de quem havia deixado o sorvete cair no chão. -Não sou do tipo que fica anos sofrendo dor de cotovelo...

É. Cutucar meu irmão sempre tinha seu preço.
Eu sei suas fraquezas, você sabe as minhas.

Mas não era para deprimi-lo mais que estava ali, o jogo não devia continuar... Ou era melhor fazê-lo de forma mais leve.
-Apesar de você não merecer, vou fazer seu dia melhor: Kiara e seus amiguinhos da pousada voltaram. Ouvi a notícia há pouco.

-Quem se importa que aquela pirralha veio se matar com a gente? – e meu irmão deu a revirada de olhos mais falsa de toda a galáxia. Ou assim eu percebi.

Você. Você se importa, e isso é tão óbvio.
Mas é melhor fingir que não sei que ele está mentindo pra mim, ele vai ficar envergonhado...

-Vocês não vão morrer! – ouviu Hiroshi protestar, na periferia da minha visão.
Como gostaria que meu pai fosse algum tipo de vidente.

-Mais gente, menos risco de morrer? – sorri.

-Só vai atrapalhar e dar mais morte pra lamentar. – notei meu irmão desviar o olhar.

Sabia muito bem como era aquilo. A vontade de ficar perto e ao mesmo tempo, a vontade daquela pessoa estar o mais distante possível daqui...
Mas o caso dele era pior, pois Kiara, sem dúvida, era mais fraca que eles...
A sensação de querer proteger deveria ser mais forte.

-Não seja tão duro com a moçoila, ouvi dizer que todos eles treinaram duro. – tentei fazê-lo pensar positivo, mas tudo que consegui fazer foi tirá-lo daquela chuva, puxando-o para a varanda antes que a chuva o lavasse tanto que seus cabelos desbotassem.

-Nós também e nem por isso me sinto seguro. – meu irmão murmurou, olhando para baixo enquanto seus cabelos pingavam sem parar.
Parecia que ele estava fazendo chover ali dentro.

-Eu sei.
Me aproximei até que tudo o que eu via eram os olhos do meu irmão. Até os cílios dele continham gotinhas de chuva. Nossas testas se encostaram.
-Eu também me sinto assim... mas vai dar tudo certo, enquanto cuidarmos um do outro, não é mesmo? O medo só machuca quem está sozinho.


[10 anos antes, numa noite de chuva]

Naquela época, Hiroshi não sabia mais diferenciar os filhos.
Apenas percebia que um dos gêmeos insistia em se movimentar demais.

[Lutador de verdade aguenta na cara, desviar é coisa de maricas]

Aquele gêmeo sempre era o mais visados para golpes mais violentos.
Aquele gêmeo era Kaoru.

A partir daí, ele diferenciava os filhos pelos hematomas que dava e mal se importava em olhar uma segunda vez para cada um.

Foi naquela noite que Kaede trocou de lugar com Kaoru na frente do pai pela primeira vez.

Um Kaoru de 7 anos tremia a cada trovoada. Mas não era por causa dos trovões – era porque não sabia diferenciar o que eram os barulhos das nuvens e o que eram os estrondos pela casa.
E se ele descobrisse?
E se piorassem tudo?
E se apanhassem o dobro?
E se ele ficasse muito, MUITO bravo?

O menino só relaxou quando ouviu a porta do quarto se abrir e viu seu gêmeo no portal.
- Ka... Kaoru! – teve o cuidado de chamar; seu pai podia estar perto.


- Tudo bem, ele tá lá embaixo, Kao. – murmurou Kaede, fechando a porta atrás de si.

Um relâmpago iluminou o quarto por alguns segundos, fazendo o mais novo engasgar; pôde ver com clareza o estado do irmão – tantos hematomas novos! Sua boca estava sangrando! Tinha um corte novinho no queixo!
- Kae! – exclamou, aflito, pegando na mão do irmão. – Você... dói muito? Você não devia ter feito isso! Eu não devia ter deixado! Urgh, tenho que pegar gelo assim que papai dormir...


- Eu tô bem, isso não é nada. – O outro abanou a mão livre, fazendo pouco, como vira seus heróis fazem em animes. – Não tem essa de você deixar, eu sou o irmão mais velho, não sou? Tenho que proteger você.

Kaoru mordeu o lábio, balançando a cabeça.
- Nós somos gêmeos! Mamãe disse que foram minutos de diferença! E... e... – ele enxugou o sangue do rosto do irmão com a manga do pijama. – Essas feridas... parecem que... doem mais em mim.


- É a mesma coisa, mano... quando é em você. – Era tudo o que sua mente infantil podia formular de toda aquela situação. – Não consigo ver você apanhando mais. A gente nasceu junto, igual! A gente apanha junto, igual!

Eles se entreolharam, as mãos ainda unidas.

- Kae... e se ele matar a gente? E se acontecer uma coisa muito ruim?
Para Kaoru, a ideia de Hiroshi matar apenas um deles parecia pior do que a primeira opção.


- Eu também tenho medo... mas vai dar tudo certo, enquanto cuidamos um do outro, não é mesmo? – Kae sorriu, um sorriso cheio de dentes faltando. – Lembra o que a mamãe dizia? O medo só machuca quem tá sozinho!
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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por Psycho Martini Seg Ago 31, 2015 5:38 pm

[Saskia]

A época de chuvas não era amiga dos cabelos e da beleza, disso todo mundo sabia.

Trinquei os dentes, mas ninguém do salão percebeu a minha irritação; todas estavam muito ocupadas fofocando, lendo alguma revista ou trabalhando, enquanto eu estava ali, de molho, esperando a tinta fazer efeito.

Aqueles rostos eram sempre os mesmos, as mesmas clientes do bairro nobre da cidade, loiras e vaidosas como eu.
Mas, cada vez mais, eles diminuíam em quantidade. Manicures, cabelereiras, clientes - todas, aos poucos, estavam desaparecendo daquela cidade.
Os nobres tinham poucos motivos para ficar ali em tempos de Guerra, afinal. Se demorar o máximo possível antes de novembro na cidade por questões de apego também não era muito viável, com esse clima horrível.

Por muito pouco meus pais não me arrastaram a força quando eles foram embora também; foi um pé no saco inventar toda uma história de um amor platônico e puro por Nikolai (rico e bem apessoado) que iria ficar na cidade e que me partiria o coração sair daqui tão cedo. Prometi sair daqui um dia antes.
Bem, eles vão esperar sentados.

As coisas que eu não fazia por amor...! Ter que ficar aqui, enfurnada nessa cidade, com toda essa umidade que faz meus cabelos necessitarem de escova e cremes anti-frizz constantes para não ficarem parecendo que levaram um choque...

Espero que fiquem pelo menos uma cabelereira, uma manicure e uma empregada em Kafundoh, ou Nikolai vai ter que lidar com meu mau-humor.

No entanto... O salão ainda está abrindo e ainda tem 2 empregadas lá em casa, o motivo da minha irritação agora era outro: certo rosto que eu quase nunca via por ali.

Acho que já fazem 2 semanas... devia ser começo de Outubro quando eu finalmente vi Íris Dufiel entrar nesse salão.
Ainda lembro muito bem como aquela baixinha entrou; os cabelos longos estavam sem nenhum fio em pé. Ela simplesmente desfez a trança que usava e pediu para cortarem a franja em estilo reto e levemente para o lado, dar uma ajeitada nos lados, apararem as pontas... e foi tudo.
Nada de manicure.
Ou hidratação.
Ou tintura.
Ou cauterização.
Nada.
Simplesmente saiu balançando os cabelos lisos como sempre. Mesmo nesse clima! Tão injusto! Ela mal precisava pisar aqui! Ela não estava nem aí se as unhas delas não tinham um pingo de esmalte ou sequer passava uma base por cima daqueles hematomas que eu vi...

De tudo aquilo, tinha o mais revoltante: ela tinha ficado linda.
Já não basta que aquela desgraçada ser uma das mais fortes e ricas (e sem estar na Saint Phoenix, por alguma razão bizarra!) de Kafundoh e estar treinando com Sydney, não! Aquilo não era suficiente para ela!
Ela TINHA que deixar de ser tábua de uma hora para a outra e ficar toda curvilínea depois de “velha”! O uniforme que ela usava mal escondia todas aquelas curvas novas e, por isso mesmo tinha gente (pasmem!) que estava até a comparando comigo!
Que audácia!
Eu sou bem mais peituda! Meus peitos são meu orgulho!

Agora cortou o cabelo e ficou com mais cara de boneca ainda! Antes, se ela fizesse isso, ela ia simplesmente parecer uma garotinha do primário, mas agora era diferente: todo um ar inocente no rostinho, contrastando com a sensualidade de um corpo curvilíneo... AQUILO ERA TUDO O QUE EU QUERIA SER!!!

ARGH!!!

Perto daquilo, minha tentativa de fazer essa combinação usando maria-chiquinhas e óculos parecia simplesmente ridícula!

Suspirei e encarei o espelho do salão, tendo o cuidado de desfazer a careta que eu estava fazendo sem notar (não quero criar rugas precoces). A garota que me encarou de volta era linda e sensual, mesmo tendo papel alumínio pendurado no cabelo.

Hunf.
Mudar de estratégia foi a melhor coisa que eu já fiz... Meus olhos são lindos, não tem sentido escondê-los por trás dos óculos – lentes são muito mais práticas e melhores.

Minutos depois, quando terminaram com o meu cabelo, eu me senti bem melhor e varri qualquer outra rival da minha cabeça. Eu estava estonteante! A mais linda de todas, sem dúvida!
Dei várias voltinhas na frente do espelho curtindo meu novo cabelo: agora estava mechado com cor-de-rosa e as ondulações estavam impecáveis e bem tratadas, como só o dinheiro conseguia fazer naquele clima. E hoje até as unhas estavam combinando com o cabelo!

- A nova eu! ~ <3 – cantarolei, completamente renovada. Nada como um trato no visual para um mulher.

Não havia dúvidas que aqueles meses estavam fazendo muito bem para mim; com ajuda do Nikolai e um psicólogo disposto a tentar novos métodos (sendo muito bem pago pra isso), eu estava, aos poucos, conseguindo me livrar da chata da Blue Saskia – uma fachada criada para agradar meus pais que logo seria completamente desnecessária – e cada vez mais sendo “eu” mesma.
Cansei de ser a “outra”, estava na hora de ser a principal.

Era apenas uma questão de tempo. Blue Saskia já tinha virado a “outra”, o próximo passo era sumir completamente.

Enquanto espero meu motorista chegar (para não estragar meu cabelo andando na chuva, óbvio), checo a lista de números telefônicos no meu celular.
Não fui a única a ficar mais bonita esse outono, não é... Os gêmeos Ryuuji estava enormes! Aqueles músculos estavam uma delícia! Jayden e Unkou também não estavam de jogar fora, mas figurinha repetida sempre ficava pra depois... Tinha certeza que só pegara um dos gêmeos... Não que fizesse diferença, mas... imagina os dois juntos? Huhu. <3

- Pena que essa cidade vazia deixa tão menos opções... – lamentei baixinho. - Queria testar meus novos charmes com sangue novo, mas acho que não vai dar...~

Percebo os olhares de inveja, despeito e raiva das mulheres que me entreouviram a minha volta.
Sorri de orelha a orelha, satisfeita.
Ah, continuem! Continuem me invejando! Adoro isso! <3

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OFF: Cabelo novo da Saskia;
http://www.polyvore.com/cgi/img-thing?.out=jpg&size=l&tid=91667560
No efeito sin city, só as mechas (e agora, as unhas) estão coloridas.
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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por White Qui Set 03, 2015 1:39 pm

[OFF: Peço desculpa caso o post saia mais pequeno do que é costume. Não é por não estar habituada a fazer roleplay na 1ªpessoa, mas porque coisas me aconteceram ontem e foderam totalmente meu mood, mas quero tratar de postar antes de me ausentar no fim-de-semana. ._.7 Also, agradecer à okaa-san pela ideia de colorir o texto com o que aparece em cor na cena. <3]


Então o Outono terrível de Kafundoh chegou, uh? Saco… Prefiro muito mais as cores vibrantes que a Primavera e o Verão trazem, e que contrastam tanto com estas chuvas fortes e o nevoeiro. Se bem que… Este clima só aumentava o suspense da época que se aproximava, e não consegui de me impedir de rir com o pensamento.
A verdade, é que eu não vi a estação passar. Eu senti. Senti melhor do que qualquer pessoa.
Aliás, eu sinto agora que tudo está diferente. A gravidade tensa que pesa nas gotas de chuva, o cheiro a relva molhada mais forte do que nunca, a humidade ao toque nos vidros do Arcade…

Por falar em Arcade, onde estará a SoaD? Desapareci sem me despedir de ninguém, pergunto-me se me vão crucificar quando me voltarem a ver, tão diferente, com os cabelos longos e molhados colados ao meu rosto e mostrando os meus lindos olhos verdes… <3 Mais parecendo uma bruxa mas nada demais.

Deixei os meus sentidos me levarem pela cidade, antes de regressar à Hospedaria da Madame Kamélia. Ah, que saudades que eu tinha dos seus pratos deliciosos, do calor e carinho que aquela nova casa passava… Estes meses tinham sido o oposto disso.

O meu treino com “o Coelho Branco” tinha sido intenso e severo, porém isso não quebrara a sua imagem de cavalheiro bonitão. Todo este tempo passado fechada na sua mansão, enquanto ele controlava a minha alimentação, as minhas horas de sono, as minhas horas de treino intensivo, tudo o que me levou até ao desmaio… Mas mesmo assim ele cuidou de mim, que nem um…

- …Verdadeiro namorado, né? – Ri novamente. Realmente, Lucius tinha sido um amor de pessoa. Tinha mantido a sua palavra, ajudando-me a melhorar as minhas habilidades e ensinando algo que só ele podia ensinar, e apoiando-me em todas as alturas que voltei a embater no chão, em que voltei a comparar-me a outros… E nas alturas em que a ótaria da irmã dele só me pisou ainda mais.

Sorri ao esconder-me no toldo da gelataria onde Josuke me levou no primeiro encontro, e onde encontrei Lucius. Os dois me deram a chance de me tornar no que sou agora: mais forte do que nunca. Juntou-se em mim o melhor de cada um como treinador, e agora criei finalmente o meu próprio estilo.

Espreguicei-me, antes de retomar o meu caminho para a Hospedaria. Mas mesmo assim, este sentimento de ansiedade não largava o meu corpo. Eu tinha tantas saudades dos meus manos, estava tão preocupada com eles, queria ver o quão tinham mudado, de aspeto físico e em termos de combate… - Ahhhh isto está-me a deixar tão animada com tudo que o meu coração não aguenta! – Saltitei por baixo da chuva, às vezes dançando. – Quero voltar a ver toda a gente… Quero que voltemos a ser uma família bem unida que não vai deixar ninguém levar esta cidade! Um elo bem unido… Um elo…

[Roupa da Kae (Imagem grande o.o7)]
Spoiler:


Última edição por White em Qua Set 16, 2015 1:41 pm, editado 1 vez(es)
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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por Kri Dom Set 06, 2015 11:45 pm

Eu sou King Fu e eu não vou falhar com nenhum de vocês.

É isso que digo a mim mesmo todo dia. Digo isso quando acordo, digo isso quando durmo, digo toda vez que vejo um de meus manos, digo isso cada vez que conto as moedas troco no horário de trabalho.

Eu recusei o convite de Singoala para treinar com ela e a avó dela. Talvez eu não devesse ter feito isso. Será que ela me achou grosso? Eu não sei. Pelo menos o mano Kurtis tomou o meu lugar e posso ficar um pouco mais tranquilo. Eu ia aceitar o convite dela mas não pude, eu senti alguma coisa. Eu senti um calafrio, sei lá, eu pude ter a certeza de que meu mestre, que o fantasma de meu mestre, que ele estava me chamando, que ele disse que ia me treinar.

Talvez ele quisesse se vingar de mim e pra isso ele tivesse me influenciado a dizer para a mana Singo que eu não iria treinar com ela. Eu não sei. Acho que ele está me desviando do treino de alguma forma. Nessas semanas que se passaram tenho sentido uma vontade muito grande de encerar carros, pintar cercas e pintar casas. Pelo menos tenho conseguido algum dinheiro com isso mesmo que às vezes a vontade seja tanta que acabo fazendo o serviço de graça. Ah, também vez ou outra sinto calores e frios súbitos que me fazem colocar meu casaco e tirar meu casaco repetidas vezes. Isso não faz sentido algum mas ao menos eu estou ficando mais rápido nisso. Será que é meu mestre tentando me passar algum tipo de mensagem? Eu não sei e às vezes tenho até medo de saber. 




Quando eu não estou encerando carros nem pintando cercas ou casas nem gastando meu tempo colocando ou tirando meu casaco eu tento treinar por conta própria. Treino chutes e socos, treino meu alongamento. Às vezes eu também treino minhas técnicas Suiken mas no dia seguinte eu acordo cheio de ressaca e não lembro de nada do que aconteceu.


Muitas vezes eu acabo treinando enquanto trabalho. Como muita gente já deixou a cidade, acaba que tem muito vaga de trabalho nos mais variados ramos. Pelo menos um pequeno lado bom disso tudo que tem acontecido: ganhar dinheiro está mais fácil. 


Outro dia eu tava trabalhando como sorveteiro e passei o dia servindo sorvete plantando bananeira para treinar a minha força e meu equilíbrio. Nunca viram alguém colocar as bolas em uma casquinha com tamanha agilidade usando os pés. O dono do carrinho disse que nunca vendeu tanto. Eu fiquei feliz por ele. E também fiquei feliz por ele.


Eu deixei o meu trabalho na boate de strippers Sabor do Pecado. Os clientes da boate diminuíram bastante e além disso as mulheres de lá estavam querendo me agarrar, falando na história do bambu sagrado e dizendo que eram a minha princesa. Nenhuma delas me enganará. Eu só tenho uma princesa. E ela não trabalha lá.


Princesa. Onde quer que você esteja, espero que eu possa te trazer algum orgulho. Onde quer que você esteja, saiba que só penso em você. Espero que voc~e não tenha se esquecido de mim porque eu jamais me esquecerei de você. Eu sei que você não me esqueceu, eu sei que não. Um dia estaremos juntos novamente. A gente prometeu.


Eu olho para o anel em minhas mãos e me sinto um pouco mais preparado para aguentar o que quer que venha. Talvez no fim de tudo a gente acabe perdendo mas eu farei de tudo para proteger minha princesa e os meus manos. A gente vai conseguir.


Eu prometo.
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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por Kri Seg Set 07, 2015 12:03 pm

Meu nome é Kurtis e eu faço o impossível e o possível se confundirem de acordo com a minha vontade.


Eu não rezo quando vou dormir. Isso não é do meu feitio. Eu não acredito em deuses nem deusas, anjos nem demônios. Apesar disso, toda vez que eu vou dormir, eu murmuro um pedido de proteção para aqueles que me são queridos, minha família do circo e a família que acabei criando em Kafundoh.


Kurt, meu falecido pai, o maior mágico que já existiu e homem em quem me inspiro. Talvez eu nunca me torne mais do que uma sombra dele, mas eu sempre tentarei seguir os seus passos.


Tio Arnold, irmão do meu pai e seu completo oposto, um homem que é tão forte quando alegre e tão alegre quanto é gentil. Sempre estive interessado em treinar a minha mente mas ele sempre me forçou a treinar também o meu corpo. Não fosse por ele talvez eu não estivesse vivo nesta cidade.


Joan, minha mãe, habilidosa mãe e contorcionista. Ela completou, complementou, as lições de vida que meu pai me passara.


Gomez, o atirador de facas cego, que de alguma maneira foi capaz de sempre me mostrar novas perspectivas de vida.


Arai e Baga, os irmãos palhaços, sempre dispostos a tirar risadas de mim nos momentos mais inoportunos. Vocês não sabem o quanto eu sou grato pelos sorrisos que me deram, mesmo que na hora talvez eu não tivesse mostrado.


Mana Singo, sempre gentil, sempre inocente, sempre forte, uma grande amiga para se ter ao lado.


King fu, a maior pessoa com mania de grandeza que já vi. Gostaria que você tivesse tanta força quanto tem vontade de nos ajudar.


Tucker, o gigante gourmet gentil, torço para que você alcance seus sonhos.


Kae, pequena mana. Não consigo te ver em outra expressão que não seja esse v de vitória.


Chun-Hei, aquela que parece carregar sobre as costas toda a sensatez e maturidade de que os outros carecem.


Tantos nomes, tantas pessoas. Desejo toda noite proteção a cada um de vocês.


Os últimos dias tem sido difíceis. Desde que cheguei na casa da avó da Singo eu não paro de treinar. Para felicidade dos meus bichos de estimação eu sempre acabo arranjando algum tempo para alimentá-los.

Treinamos o dia todo, lutando, lutando e lutando. Às vezes é um contra um, às vezes dois contra um, às vezes três ou quatro. Depois de um tempo eu acabo ficando tão focado na batalha que nem consigo pensar nos números, só consigo pensar em me desviar dos golpes e tentar acertar pelo menos um soco ou chute que seja. E quando um deles se cansa, sempre entra outro no lugar. Às vezes até sonho treinando, ouvindo a voz da avó de Singo falando.

- Ocês tão muito fraco! Kuta tá nem suando direito! Zezé, vem cá discansá, meu fi, tu tá pálido que nem fantasma! Jão, Betim, Gugu e Dedé, entrem no lugar dele! Kuta, levanta, meu fi. Leozim, Erodilson, Ayrton, Ellenilson, Fernandilson, entrem na luta!

E aí acordo no meu da noite, mas felizmente sempre me aparece uma das primas da Singo para me acalmar. É... A Singo tem ótimas primas...

O que a avó da mana tem de amável fora dos treinos ela tem de rigorosa dentro deles. Bem, era justamente desse tipo de treino que eu estava precisando. Outro dia eu e a Singo fomos parar no hospital, desidratados. Não sei como não morremos. Pelo menos passou e estamos vivos. Amanhã iremos para o circo, treinar por 15 dias com o pessoal. Consegui telefonar para o tio Arnold e falar da nossa situação. Ele disse que o circo não poderia se envolver, mas ele foi mais do que positivo em aceitar treinar um pouco a gente. Ninguém lá tem foco em combate nem nenhuma dessas coisas, mas o condicionamento físico e mental que se ganha lá sem sombra de dúvidas se mostrará muito útil nas batalhas que nos aguardam.
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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por Kri Seg Set 07, 2015 12:07 pm

[01 de Julho de 2006]
 
A viagem iniciou na noite anterior, mas esta era longa: após 12 horas viajando de ônibus, chegaram a rodoviária de CudoMundo, mas não parariam por aí; foram recepcionados por Tio Jerônimo, um senhor de seus 1,90 de altura e tão largo quanto, que os cumprimentou calorosamente e os levou em uma Picape, para serem levados até o Sítio Curva do Vento, onde passariam as férias de verão e mais dois meses. A estrada até lá era de barro e eles sacolejaram bastante por meia hora – no entanto, a paisagem levantava qualquer ânimo: frondosas e enormes fazendas com plantações de perder a vista, árvores de todos os tipos e ar puro a vontade. Ali, o calor do verão não era tão sufocante quanto em Kafundoh – a brisa era quase fresca sob o sol brilhante.
 
- Ocê num repare na bagunça, Kuta, mas a comida nunca farta e nem a hospitalidade do povo. – falou o homem ruivo e bigodudo, quando estacionava o velho carro vermelho perto de uma grande casa em estilo antigo e colonial.
 
- Ouxi, Tio, o mano Kuta é da famía, né pra ficar com besteira não! – riu Singo, tirando a mala do carro.
 
- Não precisa se preocupar, seu Jerônimo! - Disse, agradecido, enquanto parava por um instante para limpar o suor do rosto.
Por mais que estivesse calor, Kurtis nunca abandonava as camisas de manga longa. Sempre arranjava um lugar extra para esconder algum objeto. Tentou trajar a camisa mais leve que tinha.
- Mana Singo, quantos tios e tias você tem? Acho que nunca parei pra perguntar sobre a sua família. - E coçou o queixo tentou pensar em algum número.

 
- Ara... Eu tenho 12 tios por parte de mãe, isso sem contá os tios por casamento e 3 tios por parte de pai, mas esses urtímo cê num vai conhecer não. – a ruiva respondeu, sorridente. – E nem todos os meus tios maternos moram aqui, mas cê vai conhecer muita gente, sá!
 
- Nossa, doze tios, é muita coisa. Na minha família acho que a gente tem uns oito, só, que a gente saiba. Digamos que meu avô não era muito conhecido por sua fidelidade... - Kurtis coçava a nuca, divertido.
 
- Dona Nezinha, sua neta chegou! – anunciou Jerônimo com sua voz ribombante, pegando as malas dos garotos com uma mão só.
 
O que aconteceu nos minutos seguinte foi uma confusão: de todas as portas e janelas visíveis daquela casa foram surgindo rostos. Esses rostos eram sardentos, queimados de sol, emoldurados por cabelos ruivos, loiros ou de um castanho claro e também queimados. Crianças, jovens, meia-idade e alguns idosos.
- Singo! – esse nome foi repetido várias vezes, por várias vozes bem diferentes.
 
E aí eles vieram; aos montes, pelas portas e até saltando as janelas, pareciam não ter fim. As crianças e os jovens vieram primeiro e logo abraçaram a amiga de Kurtis, um depois do outro, até que não se via mais Singo. Os adultos vieram depois e os rodearam; falavam todos ao mesmo tempo e Kurtis sabia que estavam lhe fazendo perguntas, mas ele não tinha nem como responde-las. Uma coisa era fato: homens grandes eram uma constante naquela família, tanto em altura quando em largura. Curiosamente, as mulheres não seguiam esse padrão; eram menores e mais magras, como Singoala.
 
- VAMO PARÁ QUE AQUI NÉ CASA DA MÃE JOANA NÃO, DEIXA A MININA RESPIRÁ! – uma voz idosa e ríspida se ouviu e todos se calaram ao mesmo tempo.
 
Finalmente se fez a ordem, desenterraram Singo e abriram passagem dentro da roda para uma senhora idosa se aproximar dos recém-chegados. Dona Nezinha aparentava ter seus 65 anos, tinha cabeços completamente brancos e olhos amarelos com pupilas verticais, muito agudos e perspicazes e que não combinavam em nada com uma senhora idosa e baixinha.
 
- Bem-vindos, queridos. – disse, dando um sorriso inesperado e abrindo os braços, como se chamando para um abraço.
 
Quando os trocentos familiares de Singoala apareceram, Kurtis tentou responder às perguntas que lhe eram feitas, mas não conseguia. Tentou pelo menos memorizar os rostos,  o que foi se mostrava um pouco difícil por terem feições tão parecidas. O jovem se surpreendeu com a chegada da avó de Singoala e com a forma como ela mostrou sua autoridade. Kurtis respondeu o sorriso da senhorinha com um outro sorriso.
Ficou na dúvida se o abraço era para ele ou se era para Singoala, por via das dúvidas, para não passar por mal-educado, foi ao abraço da idosa.
- Acredito que você é a avó da Singoala. Meu nome é Kurtis, digo, "Kuta", prazer.

 
- Mas é claro que sou, querido. Estávamos esperando ocê, Kuta! – a idosa o abraçou junto com Singo. (Singo: Vovóóó, que saudade! Ç_Ç). – Soube que ocês são uma famía lá em Kafundoh! Minha neta me contou tudo.
 
Singo assentiu, sorridente.
- Mando carta toda semana!
 
- Mano da minha Singo é meu neto também. Não se acanhe, querido!
Quando finalmente os jovens se viram livres do abraço, Nezinha se virou aos familiares.
- Cês ouviram, né? Se alguém tiver alguma pergunta, levanta a mão!

 
Uma garota loira levantou a mão primeiro.
- Essa história de mano... é só isso? Cêis num namoram não?

 
- Obrigado pelo carinho, Dona Nezinha... - Parou por um pequeno instante e se corrigiu. - Quero dizer, vó!
Kurtis adorava esse tipo de hospitalidade, essas reuniões de famílias grandes. Lhe lembrava a sua própria família. Tentava imaginar como estariam. Seu pensamento foi interrompido pela primeira pergunta.
- [pensamento]Namorar? Hmmm... Se bem que... Hmmm... A Singo é bonita, nunca tinha parado pra reparar...[/pensamento]
- Bem, a gente não tá namorando não. ^^> Lá na pousada nós nos chamamos assim, eu, ela e todo o pessoal.  - Parou por um instante. - Qual o seu nome?

 
A loira logo ficou vermelha e escondeu o rosto entre as longas tranças, engasgando.
 
- Essa é a prima Judite. – apresentou Singo, achando graça. – Pode ficar tranquila, prima Ju, ele tá livre, leve e solto! Namoro outras pessoas.
 
Silêncio.
PessoaS?
 
- Esse aqui é o Sunno, o Sun, e esse aqui é o Kongou, o Con! – animou-se Singo, tirando duas fotos (até grandes) do bolso e exibindo com orgulho. – Já mandei as fotos pra ocê, vó, eles saum pessoas maravilhosas e...
 
Exclamações, gritinhos, comentários. Logo Singo estava rodeada novamente, agora por jovens garotas, que ficavam passando as fotos entre si.
 
- É comum se namorar mais de uma pessoa na cidade grande? – perguntou um adulto também loiro, coçando a barba.
 
- Prima Singo tá podendo, dois rapazes bem fortes e bem apessoados! – outra jovem comentou, no meio das garotas.
 
- Ara, mas diga, Kuta, ocê tá doente, por ocasiaum? Tão magrinho! – uma senhora de meia-idade se aproximou, parecia muito com a tal Judite, muito possivelmente era a mãe dela.
 
Kurtis acenou para a prima Ju. E então ouviu o comentário de Singoala. Não conseguiu deixar de arquear uma das sobrancelhas.
- [pensamento]"OutraS Pessoas" e não "pessoa"? "Outras pessoas" e não "outros garotos"? Hmmm... Acho que isso diz muito sobre Singoala. Devo admitir que eu a achava mais tradicional.[/pensamento]
E enquanto pensava se viu afastado de Singoala, que agora estava cercada de garotas, todas parentes, pelo visto. Quando questionado sobre seu peso, respondeu:
- Bem, sempre tive mais ou menos essa proporção de peso e altura... ^^>
- [pensamento]Eu acho que tô no peso, não? õ_õ[/pensamento]

 
A avó de Singo estava apenas observando até ali, mas dada a confusão do fato de Singo estar namorando dois garotos e os ânimos estarem exaltados, ela se pronunciou;
- Se isso faz minha neta feliz, os dois rapazes têm minha benção. – declarou. – Não esqueça de trazer os dois aqui, e informá que o casório também tem que sê aqui, e quero pelo menos 3 bisnetos; não importa muito quem dos dois for o pai.

 
- Certo, vó! – sorriu a primeiro-anista. – Podexá!
 
E isso bastou para o restante dos familiares, que passaram a agir normalmente, a parabeniza-la e a fazer convites para os sortudos rapazes; era óbvio que Singo era mulher demais para um homem só.
 
- Intaum nunca o alimentaram direito, pobre Kuta! – lamentou a mulher, colocando as mãos no rosto.
 
- Isso não será problema aqui, Kuta! – Nezinha pegou os dois estudantes pela mão, guiando-os para dentro da casa. – Pode comê o quanto quis é! Hoje matamo um boi, tem uma granja inteira de ovos e as vacas foram aleitadas!
E finalmente chegaram na sala da grande casa. No meio dela, a maior mesa que Kurtis já vira na vida, completamente abarrotada de pães feitos no dia, uma roda inteira de queijo da fazenda, muitas e enormes jarras de leite fresco, montanhas frutas do pomar, tijolos de presunto, cestas e mais cestas de ovos... era interminável.
 
- Pode enché o bucho, querido! – sorriu a matriarca, puxando uma cadeira.
 
 
- Nossa. Isso é muita comida. É sempre assim, mana Singo? Acho que vou sair daqui um pouco... gordo.
 
Talvez seja paradoxal mas o jovem não estava acostumado a comer em mesas grandes. Na sua vida circense a comida sempre era improvisada. Ou iam pra algum restaurante ou encomendavam marmita ou tentavam fazer um panelão dentro do circo. As mesas eram desnecessárias. O pessoal do circo-família de Kurtis comia sentado pelos cantos, uma mão segurando o prato e outra mão segurando o talher. A pousada da madame Kamélia foi o primeiro lugar em que Kurtis viu mesas remotamente grande e, verdade seja dita, nenhuma das mesas da pousada se comparava com a mesa que Kurtis tinha diante de si naquele momento.

 
- Vai sair daqui forte, mano Kuta. – corrigiu Singo, tomando seu lugar na mesa e batendo com uma mão na cadeira ao lado, indicando que ele deveria sentar ali. – Pra ficá forte tem que ter muita comida e treino!
 
- Isso mesmo, querido. – Nezinha sentou-se ao lado de Kurtis e começou a encher o prato dele, como uma avó folgada faria. – Temos que cuidar bastante da alimeçaum e nada de coisa industrializada aqui, hein!
A idosa só parou quando tinha uma pequena montanha no prato de Kurtis.
- O café da manhã será as 6 horas. É baum cê anotá. – começou, mas não esperou ninguém anotar nada. – Um pequeno descanso para a digestão, treinaremos de 7 as 12. Meio-dia é almoço, 1h de ciesta. Treino de 13 as 19h. Jantar e as 20 das 21h tem alongamento para não ficar doído. É PRA ESTAR NA CAMA AS 21 HORAS!!! Alguma dúvida, crianças? ^_^

 
- Não, vó. Não senhora. – respondeu Singo, prontamente.
 
Kurtis olhou para o prato. Tinha bem mais do que comia normalmente.  
- Gordo. - Pensou para si mesmo enquanto sentava e encarava o prato à sua frente. Mas verdade seja dita, tudo ali parecia saudável e, mais do que isso, saboroso.
 
Enquanto dona Nezinha falava os horários, Kurtis tentava memorizá-los. Tudo aquilo soava rígido demais pra ele. Principalmente o horário de sono. 8 horas de sono parecia muito mais do que ele gostaria de dormir mas talvez acabasse sedo necessário nos dias que se seguissem.
- Singo, com quem sua avó treinou?

 
- Com o pai dela. – respondeu a ruiva, antes de morder uma maçã. – Meu bivó, o grande Mata-Touros. *_*
 
- Ara, sei que é muito treino. – Nezinha parecia ter lido os pensamentos do rapaz. – Mas ocês tão indo enfrentá uma guerra... Quero os meus netos preparados além da conta.
Suspirou.
- Dá uma agonia deixa ocês irem nessa loucura em Kafundoh, mas... temos que deixa os jovens fazer suas escolhas. E crescerem.

 
- Sim, vovó. Como ocê sempre diz. – Singoala sorriu, os olhos amarelos cheios de carinho.
 
- Mas relaxe, Kuta, hoje ocês descançam. – Dona Nezinha se virou para o resto da família, que já tinham assumido seus lugares a mesa. – Hoje é dia de se inturmá e conhece as redonza. Conto cocês, hein.
 
Várias exclamações de aprovação foram ouvidas.
 
- [pensamento] Bem, só espero que antes de morrer em Kafundoh a gente não acabe morrendo aqui. ^^>[/pensamento]
 
Mas logo suas preocupações foram esquecidas no meio das conversas e inúmeras perguntas que se seguiram naquela mesa. Eram tantos nomes a aprender! Tantos lugares que queriam leva-lo! Não foi difícil se sentir parte da família logo no primeiro dia: todos começaram a imitar Nezinha e a chama-lo de sobrinho ou primo, como se ele fosse realmente irmão de Singo.
Aqueles seriam dias duros, mas calorosos e com ótimas memórias – incluso o xodó de uma prima ou duas, que davam um jeito de falar com ele depois das 9 da noite...
 
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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por Kri Seg Set 07, 2015 12:21 pm

[29 de Setembro de 2006]
 
Tudo era muito branco em volta deles.
Num momento, estavam deitados na terra, respirando barro, o suor escorrendo pelo rosto, a visão embaçando, aquela luta para manter a consciência... e no instante seguinte, ao menos era o que parecia, estavam deitados numa cama macia e confortável, o silêncio os rodeava e a visão custava a se acostumar com a claridade cegante do local.
 
- Ah... finalmente os dois estaum acordados. – aquela voz rouca e familiar da vovó se fez ouvir.
 
Singo piscou algumas vezes até conseguir focar sua avó, em seguida olhou em volta, confusa.
- Onde eu tô...? – perguntou, sua voz parecia querer sair embolada.
 
- No hospital, queridos. – respondeu a idosa, colocando o tricô que fazia no colo. – Ocês desidrataram, foi o que os médico disse... Mas já estão bem.
Ela apontou para os soros que ainda estavam conectados as veias dos jovens, pingando num ritmo regular.

 
Kurtis acordou com a conversa. Viu-se deitado em um leito de hospital ao lado do leito de Singo. Estava confuso, não sabia como havia parado ali. Sua boca ainda estava um pouco seca, sua cabeça latejava, seus membros inferiores e superiores estavam meio fracos e tremiam ligeiramente também.
- Desi...dratado?

Pouco a pouco estavam voltando as lembranças do que havia acontecido naquele treino brutal.
- Isso já aconteceu antes? Vó? Mana Singo? - Sua voz estava mais suave do que de costume.[/color]
 
Dona Nezinha assentiu.
- Ora, o que ocê esperava, depois de mais de 8 hora lutando sem comer ou bebê nada? – ela pendeu a cabeça para um lado. – O que ocês passaram foi uma experiência de quase morte.

 
Singo olhou para os próprios punhos, que estava enfaixados.
- Nunca lutei assim antes, mano Kuta, se é o que me perguntô.
 
– Não é qualqué um que pode aguentá esse treino... mas... ocês vão correr risco de vida. Nada como dar uma boa olhada na cara de inimiga antes de ter certeza do que cês querem. Do que é realmente importante. – A avó finalizou, com simplicidade.
 
- Entendi.
Seu olhar passeou de Singo para a dona Nezinha e de dona Nezinha para o resto do quarto em que estavam. Tentou, com dificuldade, se ajeitar na cama, suas costelas doendo. Encarou o soro ao seu lado, gotejando.
- A gente vai honrar esse treino, vó. Você vai ver. Nada disso será em vão.
A voz da velhinha ecoava em sua cabeça, conseguia ouvir, ainda que de forma enevoada, ela chamando mais primos e primas para lutar contra ele. A imagem ia se formando em sua cabeça. Era como enfrentar um exército interminável. Tentava fazer as contas de quantos primos foram seus oponentes nos últimos dias. Fazia as contas com dificuldades.

 
– O que cada um docês viu nesse treino, quando o desespero e o cansaço tomaram de conta do corpo... bem, isso é de cada um e não precisa dividir. Mas não se esqueçam de como é tar lá, daquela sensação... e nunca mais voltem pra ela.
Ela se levantou, indo para o meio das duas camas.
- Tenho certeza que ocês vão me orgulhá e que vão me visita nas férias de dezembro. Inteiros. – murmurou, tocando numa mão de cada.

 
Singo piscou, refletindo as palavras da avó. Era verdade... depois que cada fibra do seu corpo doía, cada partícula do seu ser clamava por descanso e água, quando ela achava que não dava mais para continuar, quando ela esticou as linhas dos seus limites... vira, sentira e fizera coisas que mal poderia acreditar. Mas aquilo era dela, só dela.
- Sim, vovó. Eu vô fazer de tudo pra num voltar mais lá. – disse ela, com uma voz firme, envolvendo a mão da idosa na sua.
 
-Kurtis prestava atenção das palavras da senhora, que demonstrava uma mistura interessante de candura e de conhecimento da vida. Ela lhe lembrava sua própria avó.
Respondeu suas palavras.
-Em dezembro eu faço uma visita a vocês, eu prometo. - Disse, determinado. Virou então o rosto para Singoala e completou. -Bora vencer essa luta, mana?
(Chegar aos limites e ultrapassá-los é chegar em um estado em que a magia e a realidade se misturam.)

 
- Bora vencer essa[b]s[/s] luta[/s], mano Kuta. – a ruiva sorriu para ele.
 
[Primeiro vamos provar nosso valor]
[Depois... vamos a Guerra.]
 
- Uma pena ocê ser da EIK e não pudê fazer parte da nossa gangue... – murmurou ela, olhando para a janela do hospital, um tanto pensativa.
 
- Mas antes de tudo isso... recebam alta logo! – Dona Nezinha exclamou, batendo palmas. – Tem um banquetão esperando por ocês em casa! Matamo 3 boi, 1 bode, 12 galinha, 10 patos, 8 perus... vai dar pra comê inté estourar o bucho, sá!
 
Singo ouviu o estômago roncar.
- Vovó...! Parece que faz anos que num como! – choramingou, salivando só de pensar. – Quero pato assado...!
 
– Pois intuam tratem de sair daqui! Bora fazer um festão!
A matriarca se virou apenas para Kurtis.
- E principalmente ocê, antes que a Judite e a Bibinha morram do coração de preocupaçaum por seu desfalecimento! – disse, mencionando as primas loira e ruiva que tanto fizeram companhia ao rapaz naqueles 3 meses. – Cuidado nos minino, hein.
Deu tapinhas na mão dele.

 
Tudo isso de bicho? Como eu disse, vou sair daqui gordo! - Disse, rindo.[
Ao ouvir o comentário da avó, Kurtis corou ligeiramente. Não esperava que ela fosse tão direta. Rapidamente se descontraiu.
-Não se preocupa, vó. Eu sou bem cuidadoso. Estou sempre precavido. Você não vai ser avó de novo ainda, não de mim. - E o jovem deu uma risada.

 
- Mano Kuta pegadô! Pega uma, pega geral! – brincou Singo. – O Terror de Kafundoh!
 
– Bem, estou contente que ocê ganhou peso desde que chegou aqui, querido, mas ainda pode melhorá muito! – a idosa deu novos tapinhas nele, agora na área do bíceps. – É só mantê a alimentação por lá!
 
Singo riu, cobrindo a boca com a mão.
- Ocê num repara, mano Kuta, aqui a gente aprecia um homi grande. – cochichou. – Num é a toa que eu namoro quem eu namoro.
 
- É como um homi deve sê, uai! – a idosa abanou a mão, como se aquilo fosse óbvio. – Enfim, vou pergunta aos dotô que horas cês podem sair, enquanto isso, tratem de descansá, queridos!
 
Não demorou muito tempo e logo estavam de alta, sendo levados de volta ao sítio por Tio Jerônimo e sua Picape.
Naquela noite, o banquete foi tão grandioso quanto Dona Nezinha prometera e a festa rolou solta sob céu aberto, pois naquele dia, por sorte, não choveu. A fogueira estava acesa, o forró tocava alto (ao vivo, por ima banda formada pelos primos mais velhos), o quentão corria nas veias e esquentava aquela noite de outono. Comeram, beberam, dançaram e riram até a lua ficar alta no céu.
Aqueles dias iam deixar saudades.
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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por Psycho Martini Qua Set 09, 2015 12:32 am

[Íris]

Mal amanhecia e o céu já estava escuro.
Para mim, sair da cama naquele clima era quase uma tortura russa... Mas as obrigações não podiam esperar.
Devo admitir que ainda sinto certa dificuldade de me mover com meu “novo” corpo, como uma adolescente jovem. Pesos e volumes onde antes não existiam nada... e até o “mundo” mudou a minha volta.

Foi quando as aulas retornaram, em agosto, que eu notei a diferença (infelizmente, sendo líder do Concelho, não poderia simplesmente deixar a escola em stand by). Agora os rapazes me olhavam, superavam o medo de mim para virem falar comigo, faziam comentários... e o pior, se declaravam.
Nunca fui acostumada com isso, por toda a minha vida eu assumi o papel de “bonitinha, mas antipática e dá medo” e depois eu fui simplesmente a “Ice Queen”, o que inspirava respeito.
Agora estava tudo de ponta cabeça e eu simplesmente não sabia como lidar... foi por isso que “deixei escapar” que já tinha namorado para um deles e a notícia se espalhou. Agora tá todo mundo pensando que é o Shimabuko...

Espero que isso não atrapalhe as coisas com a Katrina.

O Shima-kun sempre foi um grande amigo para mim. Ele sempre foi um bom ouvinte, esteve lá por mim e por mais que ele tente esconder, eu sei que muitas vezes ele lutou no meu lugar, e não só no final do ano passado... se eu pudesse escolher por quem me apaixonar, teria sido por ele. Ele realmente merecia que eu o correspondesse.

Infelizmente, as coisas não funcionam assim...

Por isso mesmo, estou torcendo para que as coisas se ajeitem com a Katrina; ela é uma boa moça e pode dar todo o amor que o meu amigo merece.
Tenho que conversar com ele para que ele seja mais incisivo e desminta esse boato, pois corre o risco que a moça fique com ciúmes... conhecendo o Shimabuko, era bem possível que ele não estivesse fazendo isso de propósito, pensando em me acobertar.

Já estava na hora de ele parar de ele se colocar no último lugar das próprias prioridades.

Afinal, agora eu já tinha o Jayden...
Sei muito bem da fama anterior do meu namorado e sim, isso me incomoda um tantinho. Não posso deixar esse fato atrapalhar o relacionamento, mas volta e meia me pego pensando se ele está me comparando com outras garotas, se ele está com saudades da vida de solteiro, se ele não está se cansando de mim e do meu “problema”...
Isso é resultado da minha própria insegurança nessa área.
Eu o amo e tenho medo de perde-lo. Mais do que eu gostaria de admitir.
Meu “problema” não incomoda só a ele...

Flashback:

Treinar todo dia está ajudando a aguentar a situação. No final da noite, estamos muito exaustos para sequer pensar em qualquer outra coisa a não ser dormir.
E tinha Sydney-sama, minha ídola. Os treinos com ela eram como um sonho realizado, por mais duros que fossem... minha admiração por ela apenas crescia a cada dia.
A verdade é que eu sempre tive certa identificação com a Invencível; muito forte, mesmo sendo uma garota e baixinha. Um modelo a ser seguido... mas também... a minha imagem mais próxima de "mãe", por mais que minha mãe biológica estivesse viva e bem.

Flashback:

Flashback:

Os treinos evoluíram em progressão e, desde setembro, eu estava treinando diretamente com Sydney, lutando com minha mestra...
Claro... eu sempre acabava cheia de hematomas, no chão, pedindo clemência. Mas a cada dia conseguia resistir um pouco mais, ficar de pé por mais tempo, enxergar mais movimentos...
Isso me deixava muito empolgada.

E é claro, continuo recebendo o apoio de Maddie e Becky.

A primeira está visitando minha casa diariamente para treinar com meu tio Walter (que não estava muito satisfeito em me deixar em outras mãos, mas ter outra discípula o acalmou), mesmo assim, as conversas estavam ficando mais esparsas e curtas – estava todo mundo muito exausto para falar demais.
Mesmo assim, sei que a minha amiga estarrá ali sempre que precisar. Para mim, Maddie é como uma irmã, uma amiga inestimável.

Tio Walter também não precisava ficar com ciúmes; para mim, ele é como um pai. Se eu tivesse mais coragem, talvez eu o chamasse assim, mas não sei como aquele velho taciturno iria reagir...

[Minha família (que escolhi) é um tanto peculiar.]

Já Becky está um pouco mais distante... acho que ela está mais concentrada nos assuntos da Saint Phoenix e não está nenhum pouco satisfeita com a posição do Nikolai nessa guerra.
Espero que ela esteja treinando direitinho. Se Maddie é minha irmã, Becky é minha melhor amiga...
Assim como eu, ela guarda muita coisa abaixo da superfície e eu gostaria que ela se abrisse mais comigo.

Se há um ponto positivo nessa guerra, é que os assuntos de gangue passaram a ser secundários e ser a líder do Conselho se transformou num fardo menor para mim... O que é muito bom, tendo em vista quem eu estava namorando.
Porém... sem dúvidas, os pontos negativos superavam, e muito, aquilo... Estou me sentindo muito mais ansiosa e apreensiva. Tenho pesadelos em que as pessoas que eu amo morrem e acordo gritando no meio da noite...

Ainda sou fraca, ainda me falta coragem, ainda sou torta e cheia de traumas, ainda me importo demais com que as outras pessoas pensam e com a minha imagem, ainda sou orgulhosa e teimosa, mas... estou trabalhando nessas coisas.

Espero que no final desse ano, não apenas a minha aparência tenha mudado...

Na frente do espelho, encaro uma garota com grandes olhos rubros, decididos, cheios de determinação. Seu cabelo está com um corte diferente, principalmente na franja e seu corpo finalmente parece com o de uma adulta. No pescoço, a jóia Evenstar que sempre usava, exceto nos treinos.

- Espero que a mudança maior seja aqui dentro. – murmuro, antes de lavar o rosto e começar mais um dia.


OFF: MEU DEUS, FICOU ENORME, ME DESCULPA, MUNDO.

Referência para cabelo da Íris: http://e-shuushuu.net/images/2015-08-10-759176.jpeg
Só o cabelo, ignorem a expressão dela e o resto, haha. xD
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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por Lady J Qua Set 16, 2015 3:20 pm

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Mensagem por Lady J Qua Set 16, 2015 3:21 pm

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Mensagem por Lady J Qua Set 16, 2015 3:22 pm

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Mensagem por Psycho Martini Qua Set 16, 2015 7:41 pm

[Flashback]

[01 de outubro]

Já haviam se passado três meses desde que Kurtis e Singoala haviam começado seus treinos com a avó de Singo, após vários momentos de alegria, treino e aventuras depois das 9 da noite com as primas, havia chegado a hora de partir. O jovem mágico havia conseguido entrar em contato com seus familiares e tinha conseguido agendar um treinamento, que se provaria ser bem diferente daquele que até então Singoala havia visto em toda a sua vida.

Avó, tios e tias, primos e primas, tudo quanto é familiar de Singoala estavam presentes, com destaque para as primas Judite e Bibinha, que pareciam mais tristes do que todos os outros ali.

Kurtis olhava para o relógio ligeiramente impaciente.
- Como eu já havia falado, Singoala, o pessoal do circo tá se locomovendo, mas o tio Arnold disse que eles iriam armar o picadeiro só para que eles e nós pudéssemos praticar em paz. As apresentações ficaram suspensas.
- Estranho, eles já deveriam ter chegado...


Singoala estava muito ansiosa. Mal parava quieta, saltando de um pé para o outro.
- Ara, ara, será que ainda demoram muito? – mordeu a unha do dedo mindinho. – Aaaah, será que vaum fazê algum número hoje, nem que seja um pouquim?

- Eles me disseram que estavam com muita pressa, que tinham que se preparar para uma apresentação. Como a gente vai treinar também isso deve deixar o pessoal com menos tempo ainda, então acho que nós não teremos uma apresentação formal. Mas só o pessoal praticando é algo muito legal de se ver. Eu era um dos únicos que praticava escondido. Não tem graça ver um show de mágica se você sabe como aquilo é feito, não é mesmo? ^^

- Verdade... – a ruiva murchou um pouquinho. – Bem, num posso reclamá, num é... mas é que eu adoro circo!

Dona Nezinha não estava muito satisfeita. Tanto teria sua netinha ‘roubada’ como achava uma falta de educação deixar os outros esperando. Ela apenas observava, impassível e de braços cruzados.

O resto da família já tinha se despedido de Singo, mas estava por ali, para fazer drama e despedidas rasgadas quando fosse o momento – esse era o papel da família, afinal.

- Bem, vou tentar conversar com eles, talvez a gente consigamos arranjar algum tempo para fazer uma apresentação privada. Quem sabe?

sua netinha roubada
[i]roubada]
roubada

Poucas palavras seriam tão precisas para descrever o que iria acontecer alguns segundos após ela ter pensado aquilo. Tudo foi rápido demais. Kurtis, Singoala e sua família estavam olhando para o lado oposto ao qual todos estavam olhando. O fusca multicolorido do circo chegou rapidamente. Das portas de trás saíram dois palhaços, duas figuras bastante semelhantes nas roupas, mas de corpos e coloração distinta. Um deles vestida verde limão e era extremamente alto e magro e o outro vestia azul escuro e era baixo e gordo.

- BAGAAAAAAAAAAAAAAAAAAA!!! - Disse, em uma voz aguda.
- A-RAI! - Disse, em voz grave.

E ao falares isso, soaram cornetas, soltaram confetes e fizeram uma pose digna de um desenho animado. Logo após ambos apontaram para Kurtis e Singoala.

- Arnold nos mandou aqui!
- Para levá-los!

- Ele disse que é hora deeeeeeeeeee!!!
- TREINAR!

- Então se não deram tchau!
- O tempo acabou!

Logo depois aconteceu algo um tanto quanto... Estranho. Os palhaços correram em direção a Kurtis e a Singoala. Enquanto corriam, seus sapatos faziam aquele som de boneco de borracha infantil sendo pressionado. Eles levantaram Kurtis, Singoala e suas respectivas malas como se fossem nada e jogaram pra dentro do carro. Os palhaços entraram no carro, fecharam as portas e o carro saiu correndo. Enquanto o carro saía era possível ouvir o som de cornetas e os palhaços falando.

Tudo muito rápido, nenhum cumprimento, só dois palhaços jogando os protagonistas do post no carro.

- MWAHAHAHAHAHAHA! Vocês viram as caras deles? Muito bom, muito bom!
Aquela risada parecia familiar. Aquela voz que vinha da cadeira do motorista parecia familiar. O porte físico também não mentia... Tucker?


- Ara...? – a tia piscou.
– Singo? Kuta? O que foi...?
- KUTAAA, SENTIREI SAUDAAAADES! – era a voz de Bibinha, gritando enquanto corria atrás do carro.
Foi como um sinal. Logo a família de Singo corria atrás do carro, gritando despedidas, entrando no choro e etc.
- SE CUIDEM E CUIDADO COM ESSES MALUCO! MANDEM CARTAS! – Dona Nezinha se fazia ouvir, mesmo já a distância. – ESCOVEM OS DENTES!
[color=yellow]- Não esqueça de ligar, Kuta~~~!
Pouco tempo depois, eles pararam de correr e ficaram para trás, acenando até sumirem de vista na primeira curva.
Singo parecia um tanto surpresa e amassada no canto do carro, com o novo penteado do cabelo torto na cabeça: agora ela não usava mais o habitual coque trançado, mas seus cabelos eram em maioria solto, exceto por parte do cabelo preso em um rabo-do-cavalo alto.
- U-ué... ara... foi tudo tão rápido e... MANO TUCA? O_O MEO DEOS, COMO OCÊ ENVELHECEU, O QUE CONTECEU COCÊ? – engasgou.

- MWAHAHAHA! Tuca? Quem é Tuca? Kurtis, você andou falando a meu respeito pro pessoal? Inventou um nome pra mim? Tentou me deixar famoso pelas bandas daquela cidade em que você tá morando? Como é mesmo o nome da cidade? Kafofo? Kifofo? Kidunfoh?

- O nome da cidade é Kafundoh, tio. ^^' E não, não inventei nome nenhum, é que tenho um amigo que parece muito com o senhor.

- MWAHAHAHA! Já gostei dos seus amigos. Quero conhecer esse tal Tuca e ver se ele é forte. Soube que você também tava morando num puteiro. Meu sobrinho! Num puteiro! Me mata de orgulho! MWAHAHA! - Arnold olhou então para o espelho de cima do carro, encarando a jovem. - Qual o seu nome, garota?
No espelho era possível ver o rosto do tio e, realmente, não bastasse o porte físico e a voz, até mesmo o rosto era bastante parecido com o de Tucker. Tá certo que havia algumas marcas de envelhecimento aqui e ali, mas somente alguém de olhar aguçado conseguiria notar muitas diferenças. Para olhos destreinados, só havia uma diferença notável entre Tucker e Arnold. Arnold era portador de um majestoso... bigode, sim, isso mesmo, um bigode, um moustache, na verdade, um bigode grosso com as pontas enceradas e voltadas para cima.

(referência: https://s-media-cache-ak0.pinimg.com/236x/45/41/95/4541950d46a89f6e1dfc609ffefd808b.jpg)

- A hospedaria da madame Kamélia num é um putero. – Singo inflou as bochechas. – É uma casa onde as meninas trabaia no segundo andá.
Ela falou aquilo como fizesse muito diferença, bastante defensiva.
- Ara, mas o sinhô é mesmo perecido com nosso mano Tuca, mas só que ele é um rapaz, né... Desculpa aê. – a garota se ajeitou no carro, tentando arrumar os cabelos. – Sou Singo Taiga, muito prazê!

- MWAHAHAHA! Eu também sou um rapaz, senhora Singo Tiger! Eu não sou uma menina! MWAHAHA! Tão inocente, tão pura! Não notou que só rapazes são capazes de ter um bigode como este! - E ao dizer isso o seu bigode deu um enorme brilho. - Casa de trabalho das mulheres no segundo andar! Gostei do nome! Nós podíamos chamar o circo de casa de trabalho de lona. O que acham? MWAHAHA! - Ao terminar os palhaços deram uma risada.

Arnold. Forte, honesto, sincero, sem noção. Estas são algumas das várias palavras capazes de descrever esse homem. Análogo à Singoala, é um homem que não carrega malícia no coração. Não carrega malícia e muitas vezes não carrega pudores, sendo "discrição" uma palavra riscada do seu dicionário (MWAHAHA? Discrição? Isso tem gosto de quê?)


Baga e Arai, a dupla de palhaços. Eram irmãos, mas não de sangue, apesar de que quem quer que os visse juntos diria o contrário de tão grande que é a sua sincronia. Permaneciam calados, apesar de serem sempre tagarelas. Respeitavam Arnold e não queriam atrapalhar a sua conversa.

- Ara... Rapaz no sentido de homem adolescente, uai. – explicou Singo. Talvez fosse uma barreira de comunicação, por ela ser do interior. – O sinhô já é adulto.
A caipira ficou sem entender muito bem o que Tio Arnold queria dizer e, pode-se dizer, que tinha certa dificuldade de saber o que era ironia ou não.
- Mas realmente é um belo bigode, se me permite dizer. – acrescentou.

- MWAHAHA! -Você sabe reconhecer um bom bigode! Já gostei de você! Quanto tempo temos? Duas semanas?
Arnold era uma pessoa difícil de se interromper. A risada, além de ser sua marca pessoal, sempre o ajudava a ter sua vez nas conversas, mesmo que ele não fizesse de sua gargalhada com esse propósito.
- MWAHAHA! Que os jogos comecem!


E com isso o fusca desapareceu no horizonte em direção ao circo. Aqueles dias se mostrariam bastante peculiares àqueles dois jovens.



Depois de algumas horas de viagem os estudantes Kurtis e Singoala, os palhaços Baga e Arai e tio Arnold (Arnold: MWAHAHA, gostei desse narrador!) chegaram ao circo. Era um local no mínimo peculiar. Estavam isolados da civilização, no meio do nada, no que parecia ser um deserto. Havia formações rochosas, areia e vegetação rasteira por todos os lados com alguns cactos aqui e ali.
No meio dessa paisagem havia meia dúzia de caminhões espalhados, cada um com a logo do circo, que consistia em um leão com cartola e moustache com a inscrição "Circu di Luneil" em baixo em letras garrafais. O pessoal também havia armado a área de treino, que consiste em uma espécie de mini-picadeira e também em uma área à céu aberto.
Uma vez que chegaram ao seu destino, os palhaços abriram as portas e já foram retirando as malas. Tio Arnold desceu do carro prontamente.

Arnold fez um gesto de boas-vindas e disse:
- Kuta. Seja bem-vindo de volta ao lar. Taiga, seja bem-vinda ao mundo de maravilhas do Circu di Luneil! MWAHAHA! - Fazia um sorriso gigante, mostrando os dentes surpreendentemente brancos por baixo do bigode.


Singo mais parecia uma criança de 5 anos de idade, indo pela primeira vez no circo.
- Waaaah, waaah, tão mágico e misterioso! – exclamou, batendo palmas consigo, toda empolgada. – Mano Kuta, cê vivia aqui?
Ela sorriu de volta para Arnold.
- Pôxa, brigada, tio Arnoldo, mas pode me chama de Singo mesmo, sá!

- Mas Taiga é um nome muito interessante, não acha? Fufufu. - Disse uma velhinha que apareceu subitamente ao lado de Singoala.
Tudo nela passava uma imagem de fragilidade. Seu cabelo era branco como a neve e estava amarrado em um coque. Seu rosto e suas mãos eram bem enrugadas. Usava uma saia longa roxa, uma blusa branca e um manto vermelho. De todos os presentes ela possuía a menor estatura.
- Posso ver a sua mão? - Continuou.


Singo quase saltou com o susto.
- Ara! Quem vem a ser a sinhora?
Mas logo a ruiva estava recuperada e curiosa. Ela se aproximou da idosa, os grandes olhos amarelos bem abertos. Quase parecia querer farejá-la.
- Mas fica tão formal... – lamentou. - Ah, bem, pode sim, uai.
Ela ofereceu a mão, ainda olhando-a com curiosidade.

- Taiga é uma corruptela do nome "Tigre". Pelo que consigo enxergar eu diria que é algo que reflete o momento pelo qual você tá passando, minha criança. Vamos, vamos, deixe-me ver sua mão.
E a senhorinha segurou a mão de Singoala. Seu toque era aveludado. Abriu bem a mão de Singoala e passou o indicador por entre os sulcos de sua mão, sentindo os contornos das linhas.
- Vejo que você é uma pessoa dedicada, trabalhadora. Vejo também que está passando por momentos difíceis. Algum ente querido seu está passando por problemas de saúde? Morreu? Você ama meu neto? Talvez algum familiar não esteja bem? Um amigo, talvez?


- Vóoooooo! u_u' - Disse Kurtis, sem jeito, com as bochechas avermelhadas. - Não se preocupa, mana Singo, minha vó é assim com todo mundo.

- Err.. o momento difícil é bem... estranho. – Singo mordeu o lábio inferior. – Mas meus familiares tão bem, brigada. E meus amigo tão bem... Por enquanto.
A caipira olhou o horizonte, como se pudesse ver Kafundoh mais além. O peito apertou com a saudade.
- Ahaha! Eu amo seu... neto, não é? Como meu irmão, que é o que ele é, né, Kuta? – ela riu, achando graça na situação.

-Não liga pra ela não, mana Singo, minha avó é assim mesmo, não é, vó...? Vó...?

...

- Vó?

A velhinha havia desaparecido.

- MWAHAHA! Taiga, essa foi a Dona Dolores Destino, a vidente "Senhora do Destino", avó do Kurtis por parte de pai, que Deus o tenha. Ela é assim mesmo, aparece quando quer, some quando quer, fala o que quer, faz o que quer quando quer, mas sempre toma a atitude certa no momento certo. A sabedoria dela a torna uma pessoa extremamente forte. - Pausou por um instante. - Os palhaços já levaram as suas malas. Quer conhecer o pessoal?

- Uh? Oh! Ohhh! Mágica! – bateu palmas. - Ah, muito interessante a sua vó, Kuta...!
Quando Arnold os interrompeu, Singoala estava procurando a senhora dentro da mochila que usava.
- Dona Dolores, foi um prazê! A senhora inté lembra a minha avó! – disse para a própria mochila e depois se virou para o grandalhão. – Mas é claro, tio!

- MWAHAHA, vamos então! - Disse o homem-urso, cuja aparência era basicamente a do Tucker, só que com bigode.

Arnold os levou para dentro do picadeiro, onde estavam alguns dos membros do circo, todos sentados em banquinhos na plateia. O trio entrou pelo local das apresentações. Kurtis estava silencioso, sabia como seu tio gostava de fazer essas apresentações, de tomar a fala para si, o que condizia bem com seu papel dentro daquela grande família. Arnold começou a falar.

- Então, Taiga, Kurtis me falou muito bem de como foi o seu treinamento, do quanto vocês tiveram que lutar. De quantas pessoas vocês tiveram que lutar. Eu sou grato por isso. Aqui no circo nós não temos um conhecimento formal de como lutar. Isso a gente não pode dar a vocês. O que a gente pode te dar é melhorar as suas condições físicas e mentais. A forma como vocês vão utilizar isso depende somente de vocês. Vamos começar! MWAHAHA!

Refletores foram acesos e foram iluminando um a um os membros do circo.
- MWAHAHA! Joanne! Minha querida irmã, a melhor contorcionista do mundo e mãe do nosso querido Kurtis! No que depende dela vocês vão sair daqui conseguir lamber o cotovelo conseguindo encostar o calcanhar na nuca! Ela também lhe ajudará no seu senso de equilíbrio.
Uma mulher linda usando collant acenou com a mão, depois plantou bananeira e acenou com um dos pés, seus movimentos sendo um excesso de graciosidade.

- MWAHAHA! Gomez! Ele é o atirador de facas cego mais certeiro que já se viu na face deste mundo e de todos os outros! Ele irá ensinar a vocês uma percepção que não é deste mundo!
Gomez usava uma faixa ao redor dos olhos. Acenou e depois atirou seis facas, cada faca parando perigosamente perto dos pés de Arnold, Singoala e Kurtis.

- MWAHAHAHA! Baga e Arai! Vocês já os conhecem. Eles irão ensinar a vocês o verdadeiro significado de se trabalhar em equipe, sobre como sincronizar as suas ações com a dos seus aliados.
Os palhaços soaram buzinas em uníssono.

O refletor foi apontado para Arnold.
- MWAHAHA! Eu! Arnold! O homem-urso! O homem-bala! O malabarista de bolas de boliche! Eu ensinarei a vocês o que é força de verdade! Há muitos outros aqui também, mas eles não terão muito tempo para ajudá-los pois temos uma apresentação marcada para daqui a uns vinte dias, mais ou menos. Dona Dolores também talvez ajude. Ela e o pai de Kurtis ensinaram a ele tudo o que ele sabe. - Disse, colocando uma de suas mãos sobre o ombro do sobrinho. Preparem-se. - Seu tom ficou sério. - Serão duas semanas infernais.


A cada pessoa apresentada, o queixo de Singo ia caindo cada vez mais, enquanto seus olhos iam ficando arregalados. Batia palmas a cada apresentação, emocionada, como se estivesse realmente numa apresentação. No final, ela estava esbaforida e quase sem palavras, era muita emoção para uma caipira só. Aquelas pessoas pareciam incríveis e ela iria ficar 2 semanas inteiras com elas!
- Muito prazê! Joana! Gomes! Bago! Ariel! Arnoldo! – ofegou ela, - Sou Singo Taiga, por favô, cuidem bem de mim!
Ela mordeu o lábio, levemente decepcionada que a apresentação seria para depois de sua partida, mas longo mudou o rumo dos pensamentos.
- Vô dar tudo de mim, num si preocupe, minha vó me ensinou como ser durona! – e fez um punho com uma mão.

E assim se seguiram duas semanas. Ao contrário do que pudesse parecer inicialmente, o treino foi extremamente pesado, comparável ao treino com a avó de Singo. Nenhum chute foi dado, nenhum soco foi dado, mas eles foram levados ao limite. Seguem alguns dos vários treinos.

Em um dia, foram deixados por 24 horas seguidas na jaula dos leões, onde poderiam usar somente uma cadeira cada um para se defender. O treino objetivava o controle emocional e completo controle sobre o medo (Arnold: MWAHAHA, isso cria fibra!). Testou a sua capacidade de manter seu rendimento mesmo sobre os efeitos da fome e do sono.

Em um dia Gomez foi o mestre. Seu treino consistia em duas etapas. A primeira testava a coragem e a confiança. Cada um seria colado a um alvo que seria utilizado por Gomez para praticar sua pontaria. A outra etapa do treino consistia em eles mesmos atirarem as facas com os olhos fechados (por segurança, Singoala e Kurtis utilizaram um desenho de uma pessoa no lugar de alguém de verdade).

Em outro dia, a mãe de Kurtis utilizou um sistema de cordas e roldanas para treinar a flexibilidade de ambos aos limites. O treino e a dor pareciam durar uma eternidade. Seriam esticados até gritarem de dor ou até onde fosse possível, o que viesse primeiro.

Baga e Arai lhes ensinaram um treino de sincronia. Ambos deveriam ficar um ao lado do outro, olhando para a frente e fazendo movimentos sincronizados. Um erro e um acabaria golpeando o outro.

Arnold tentou ensiná-los a fazer malabarismo com bolas de boliche sobre um monociclo na corda bamba, mas não deu muito certo. Limitou-se a ensinar-lhes somente como fazer malabarismo e como andar sobre a corda bamba.

Em um dos dias, Kurtis foi o professor e tentou ensinar a Singoala alguns truques de baralho, coisas simples. Inclusive lhe deu uma caixa metálica contendo dois conjuntos de baralho e alguns dados, um pequeno presente.

Esses foram somente alguns dos vários treinos. No 13º dia, descansaram. No último dia, fizeram uma apresentação particular para Singoala (Kurtis trabalhou como mágico na apresentação.).

No décimo quinto dia foi a despedida. Arnold, Singoala, Kurtis, Baga, Arai estavam no carro. Do lado de fora estavam todos os membros do circo acenando, alguns chorando.

- Tai-ga! Tai-ga! Tai-ga! - Diziam em uníssono. Haviam se apegado bastante à ruiva.

- Kur-tis! Kur-tis! Kur-tis!

A avó de Kurtis apareceu e todos ficaram em silêncio. Ela se limitou a dizer uma única palavra.
- Vençam.

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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por Psycho Martini Qua Set 16, 2015 8:17 pm

[Singo]

Sempre fui do tipo de pessoa que combina mais com a luz, com o sol, com o calor. Aquele clima pesado, escuro e tenebroso era o oposto do que me agradava... mesmo assim, voltar a Kafundoh me enchia de alegria. Sabia que meus olhos amarelos estavam brilhando.

Mal podia esperar para reencontrar os meus manos!

Mana Chun, será que ela aprendeu a relaxar mais? Debaixo daquela expressão severa eu sei que tem uma menina sensível e muito boa, ela só tem que se dar conta disso...

Mana Kira, selvagem como ela só, mas uma amiga com bons conselhos. Ainda vou lutar com ela um dia.

Mana Kae, com seu jeitinho meigo e travesso, um doce de pessoa, será que conseguiu resolver os problemas no amor?

Mano Fu, sem juízo como ele só, espero que não tenha sido possuído por algum demônio nesses treinamentos estranhos e tenha desistido das ideias malucas dele...

Mano Tuca, será que engordou? Será que ficou maior ainda como o Binow? Isso eu quero ver. Vai ficar cada vez mais difícil derrota-lo...

Mano Bob, será que treinou também? Espero que aquele coração de manteiga esteja se cuidando e não apenas pensando nos outros...

Me esperem! Estou trazendo de volta o mano Kuta! Ele continua cheio dos mistérios misteriosos, mas agora tá mais forte e mais pegador! Vocês precisam ver...

E claro que não estou esquecendo dos meus amores... Con e Sun, estou chegando! Estou morrendo de saudades dos dois! Con e seu jeito sério e protetor, Sun e seu jeito selvagem, mas desconcertado... Amo cada pedaço deles! Espero que o Sun esteja mais forte e que o Com se prepare pra apanhar de mim!

E eu... eu... bem, eu acho pude cumprir meus objetivos...
Muita coisa aconteceu nesses três meses e meio.
Muita coisa divertida.
Mas também...

Flashback:

Por mais que certos momentos tenham sido duros ou dolorosos, tudo valeu a pena. Eu estou me sentindo mais confiante e sei bem o que tenho que fazer aqui.
Não vou ser mais um peso para ninguém!
Vou mostrar a eles!

Continuei avançando em direção a porta da pousada, o guarda-chuva mal contendo aquele aguaceiro que caia do céu. Já estava encharcada, de qualquer forma.
Fechei o punho e bati.

- Mamãe Kamélia... tô de vorta!
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[15/10/06] Kafundoh Noir Empty Re: [15/10/06] Kafundoh Noir

Mensagem por Reid_Hershel Dom Set 20, 2015 12:31 pm

[Tucker]

Finalmente, aqui estou. De volta a Kafundoh, essa cidade maravilhosa que agora terei de lutar para protegê-la. Muita coisa aconteceu comigo e Kiara durante esse tempo de treino e espero rever todos em boas condições.

Esse clima é tão melancólico. É como estar numa cidade fantasma. E caramba, estou com muita fome, sorte que parei para comprar um pacote de bolachas. Vamos ver se elas ajudam a me saciar.

....

....

Lágrimas? E-eu estou chorando... Eu tinha me esquecido o quanto isso era gostoso. Mas será mesmo? Ou é o tempero da saudade mexendo comigo. Há tantas coisas que nunca mais pude comer. Não tinha essas regalias aonde fui. Parece até o melhor biscoito da minha vida.

Pensando bem, a segunda parte do meu treinamento foi praticamente um inferno na Terra. E todas as cicatrizes no meu corpo servem como lembrete desses dias. Especialmente essas cica... não, marca que agora habita a superfície do meu peito. Agora eu sei bem o que é uma luta pela vida. Eu poderia ter morrido naquele dia, mas aqui estou, pronto para jogar cara e coroa com a Morte outra vez.

Espero poder ver todos os meus manos. Digo e repito. O maior tempero da vida é a saudade. Sempre torna tudo mais gostoso. E Sokô... será que está tudo bem com ela? Bem, uma coisa de cada vez. Cocei a minha espessa barba, que particularmente acho que cai muito bem com o meu novo visual. Me sinto um homem das cavernas descogelado na sociedade moderna.

E lá estava, aquele humilde estabelecimento onde muitas mémorias boas foram contruídas. Sem relutância, caminhei até a entrada, com um largo sorriso em meu rosto cansado.

- Aqui estamos... O nosso lar.
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